domingo, 11 de março de 2012

Kalós [vídeo] + [ensaio]

O segundo tema que os nossos exegetas estudaram foi "kalós", comumente traduzido por "o belo" – desde que não limitado a seu uso puramente estético. Desta vez, não teremos um ensaio, visto que o texto do vídeo já ficou grande o suficiente para explicar o tema. Esse vídeo foi uma súmula das nossas pesquisas e reflexões, e está no nosso canal do youtube, com texto/edição da Alexandra Nikasios e narração do Jota Aktaios. Agora você pode vê-lo aqui:




Se você quiser saber mais sobre Kalós, aguarde a próxima postagem do Thiago com religião comparada. Recomendamos especialmente trechos de "A República" de Platão; "O Banquete" de Platão"; "Arte Poética" de Aristóteles; "5ª Enéada" de Plotino; "Kalos Kai Agathos: Homeric Origins" de Thomas Brian Mooney; e "Plotino: uma perspectiva neoplatônica da estética" de Bento Silva Santos.

Segue abaixo o texto utilizado no vídeo:
Para os antigos helenos, um bom cidadão deveria ser "kalós kai agathós". Esse agathós originalmente tinha um sentido de nobre, valente, hábil, virtuoso - quase como um adjetivo de areté; mas, com o tempo, foi adquirindo o sentido de bom'. Assim como traduzimos areté por virtude sem conotações morais, também traduzimos agathós sem conotações éticas ou estéticas. Agathós está ligado à realização de uma função. Exercer sua função social faz o indivíduo ter areté/virtude e ser agathós/virtuoso(bom). Ser agathós é ser majestoso, corajoso, esperto, habilidoso. Platão imaginava a kalokagathia como a soma de todas as virtudes. Aristóteles a via como uma alta capacidade intelectual subsidiada pela aquisição da areté, ou seja, viver suas potencialidades e ser virtuoso tanto no espírito quanto no corpo. Ser belo e bom.
Mas o que é belo? Kalós é o adjetivo para 'belo', usado tanto para seres animados quanto inanimados. Ser belo não é só ser proporcional, saudável, forte. Tem a ver, sim, com uma prática, uma técnica. Kalós vem de kaleo (chamar), pois é aquilo que nos chama, que nos atrai. É belo quem adequa as coisas humanas ao pensamento divino. 
Quando Homero descreve os navios, armaduras e armas, ele o faz para demonstrar a excelência dos objetos através da sua beleza: um navio de madeira bem modelada, uma armadura brilhante, uma lança bem reta e afiada. Sendo moldados em belas formas, seguindo os padrões da natureza, refletindo o melhor que a paciência e habilidade artística gregas podem produzir, esses objetos executam sua função, seu propósito, com excelência. Eles tinham valor. E eles reproduziam o valor dos seus construtores.
Para Platão, as representações materiais do belo compartilhavam da Beleza Absoluta/Universal, aquela do mundo das idéias, desprovida de relatividade. E, se o belo revela o Ser e não é relativo, então a Verdade seria uma garantia da Beleza. O Bem seria a origem de tudo o que é reto/justo e belo. Platão pede que o filósofo se eleve até a Beleza em si, diz que é Éros quem nos conduz à Beleza, e afirma que devemos melhorar o mais possível a alma, pois as virtudes e todos os outros bens particulares e públicos provém disso, e não o contrário, como pensam os que cuidam com mais afinco do corpo.
Já para Aristóteles, o belo não se dava por uma relação com o Ser e a Verdade, mas com a perfeição das formas. Ou seja, era algo definido, simétrico, ordenado, proporcional, harmônico, equilibrado, de justa medida (métron), e não algo metafísico. E isso não teria relação direta com a arte, já que algo feio e estranho poderia ser fruto de criação artística. A arte, para ele, podia ser tanto útil (a que proporciona catarse e completa uma falta) quanto imitativa da natureza, mas ela poderia trazer também coisas surpreendentes e estranhas.
Para Plotino, existia a beleza dos corpos, a Beleza das almas e a Beleza eterna, sendo esta última idêntica ao Espírito (noûs) e ao Ser -- o que nos lembra novamente a visão metafísica de Platão. A beleza se refletiria na arte porque proviria da forma que está no intelecto do artista (que ele resgata em sua visão daquilo que conhece) e não do seu fazer manual, sua habilidade prática. Não era uma questão de simetria, como em Aristóteles, e sim um valor associado a uma harmonia de revelação metafísica. A Alma só é bela pela Inteligência, e as outras coisas só são belas pela Alma que lhes dá a forma. 
Por essas questões do belo como possuidor do valor da harmonia e do belo como reflexo de algo metafísico é que cabe discutirmos o kalós dentro da religião. Kalós como adjetivo de Areté, a excelência, nos lembra que um mundo excelente é aquele que possui ordem (cosmos) e beleza.
Que tal agora refletir sobre o que você tem feito para espelhar 'o bom, o belo e o verdadeiro' no mundo?

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