sábado, 29 de outubro de 2011

Areté [ensaio]

Você já parou para pensar por que, em diferentes momentos, devemos agir de uma forma ou de outra? Desde a antiguidade, havia essa necessidade de pontuar a forma adequada de agir em determinadas situações. Somente algumas delas pediam que fôssemos bravos, generosos, compassivos etc, e isso dependia de uma avaliação racional, onde se deliberava sobre esse 'como' e 'por que' agir. Tal avaliação e deliberação era algo importante dentro da questão da virtude

Para os antigos, a virtude [ἀρετή] não era tomada apenas no sentido moral. Ela também possuía um caráter intelectual. Platão e Aristóteles entendiam que a parte racional da alma era dividida em dois estágios, um superior e um inferior. O superior seria a razão intuitiva (que Aristóteles chamava de epistemonikón e Platão de nóesis), cujas virtudes seriam fruto da contemplação intelectual. O inferior seria a razão raciocinante (logistikón para Aristóteles e diánoia para Platão), cujas virtudes seriam fruto de escolhas, de prática, de hábito. A 'virtude' estaria na ação moderada, a justa medida, situada entre o extremo da deficiência e o extremo do excesso. Estes seriam como 'vícios'.

Mas o que faz com que um ação seja virtuosa? A virtude das ações e posturas do indivíduo não apenas reside no fato de realiza-lás, mas também nos motivos pelos quais se realiza. Na filosofia antiga considera-se não-virtuosa a ação realizada por interesses outros que não ela mesma e o fim que dela resulta, isto é, não se é virtuoso tomando uma atitude corajosa se ela for feita tendo por objetivo, por exemplo, a fama que isso trará, ou ainda um benefício financeiro. Também considera-se não-virtuoso agir de maneira incongruente à situação na qual se está inserido, como por exemplo ser compassivo durante uma batalha ou um médico ser desatento durante uma cirurgia.

É através da deliberação -- o processo racional, ligado à virtude intelectual da prudência, através do qual analisamos e fazemos escolhas racionalmente/conscientemente sobre as mais diversas coisas -- que o sujeito levará em conta seus valores (sobre aquilo que é bom e correto), os quais devem ter sido adquiridos e interiorizados pelo indivíduo no processo de habituação/educação pelo qual ele passa na infância, e estes serão decisivos para uma ação virtuosa ou não.

Assim, observa-se que ser virtuoso está intrinsecamente vinculado à pratica social, exceto - como considerado por Aristóteles - no que diz respeito à virtude intelectual da sabedoria, pois para sua execução nada mais é necessário além da não-necessidade do exercício da virtude prática.

Para concluir, é importante levar em conta que, nem na antiguidade, nem na contemporaneidade, ser exclusivamente religioso, observador e cumpridor dos ritos e festivais civis-religiosos, faz alguém mais virtuoso. É preciso considerar que ser virtuoso religiosamente é sim realizar dentro do possível os cultos devidos, mas que isso não nos exime de agir de forma virtuosa socialmente, mesmo porque o agir social na antiguidade era parte do religioso e do cumprimento do dever de todo cidadão.

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